sábado, 24 de outubro de 2009

Estrelas destruíram primeiros núcleos do Universo

Assumindo que o universo começou muito mais quente e denso que hoje, os cosmólogos calculam o quanto de elementos químicos leves se formaram durante os 15 primeiros minutos após o big bang. Os astrônomos, porém, observam mais lítio primordial que o esperado. A teoria do big bang estaria errada?
Andreas J. Korn, da Universidade de Upsala, Suécia, e colaboradores da Dinamarca, França e Rússia propuseram uma solução para o dilema: as primeiras estrelas teriam desintegrado o lítio produzido no início do universo.
Eles chegaram a essa conclusão ao comparar as composições químicas das atmosferas de várias estrelas do aglomerado globular NGC 6397. O estudo foi publicado na Nature de 10 de agosto.
Nature 442, 636-637(10 August 2006)

As características dessas estrelas, que estão entre as mais antigas da nossa galáxia, foram registradas pelo telescópio VLT (Very Large Telescope), do Observatório Europeu do Sul (ESO), no deserto do Atacama, Chile.
"Investigamos se a física das estrelas é a responsável por essa discrepância", explicou Korn em entrevista ao Nature Podcast. Segundo a equipe, os cálculos cosmológicos estão corretos. As evidências são de que a circulação do material dentro das estrelas carregou boa parte desses núcleos atômicos para o centro delas, onde foram inicinerados. Elementos primordiais
Há 13,7 bilhões de anos, logo após o big bang, não existiam galáxias, estrelas ou planetas. Havia apenas um gás quente quase uniforme por todo espaço. Nos primeiros minutos de existência do Universo, a densidade e a temperatura desse gás eram tão altas quanto dentro das estrelas, o suficiente para prótons e neutrons se fundirem e formarem os núcleos atômicos mais leves: hidrogênio, deutério, hélio e lítio.
Após 15 minutos, a expansão do Universo rarefez o gás, interrompendo o conjunto de reações de fusão nuclear que sintetizam os núcleos — a núcleossíntese —, que só voltou a acontecer 200 milhões de anos depois, no interior das primeiras estrelas.
A teoria da nucleossíntese do big bang prediz as mesmas porcentagens de hidrogênio, deutério e hélio observadas pelos astrônomos.
O lítio primordial parecia ter sido descoberto em 1982, nas estrelas mais velhas da nossa galáxia. A porcentagem de lítio de peso atômico 7 é igual em todas elas, não importa qual a massa ou a proporção de outros elementos químicos da estrela. Isso sugere que esse lítio-7 já existia nas nuvens de gás que deram origem a essas estrelas e não foi criado dentro delas.
Em 2003, no entanto, a sonda espacial WMAP, da NASA, começou sua missão de analisar as variações na radiação de microondas que permeia o universo. Ela surgiu 380 mil anos após o big bang, quando o universo resfriou-se o suficiente para que os elétrons se ligassem aos núcleos atômicos, formando os átomos eletricamente neutros.
Os dados do WMAP permitiram calcular a porcentagem de lítio primordial com maior precisão. Para surpresa de todos, o valor é o triplo do observado em 1982.
"Essa discrepância do lítio cosmológico desafia seriamente nossa compreensão da física das estrelas, da núcleosíntese no big bang ou de ambos", afirma o artigo. Resolvendo contradições
Alguns pesquisadores tentaram recalcular a quantidade de lítio primordial, assumindo teorias alternativas de núcleossíntese. Experiências em laboratórios de física nuclear, entretanto, descartaram essa possibilidade.
Outra explicação possível seria que as estrelas mais velhas consumiram de alguma forma dois terços de seu lítio-7 original.
Como os astrônomos enxergam apenas os elementos na superfície da estrela, o lítio-7 poderia ter se espalhado pelo gás estelar chegando ao centro delas. Ali, temperaturas de milhões de graus Celsius permitiriam reações nucleares que os desintegrariam.
O problema com a idéia é que "esse efeito aumenta com a massa estelar, em contradição com a observação", explicou Corinne Charbonnel, do Observatório de Genebra, Suíça, em artigo na mesma edição da Nature. "Parece que esse mecanismo é ineficiente nessas estrelas."
Se a difusão microscópica dos núcleos não explica por que todas as estrelas antigas da galáxia têm a mesma porcentagem de lítio-7, então, talvez, outro fenômeno os teria transportado.
De fato, os astrônomos sabem que, no Sol e em outras estrelas mais jovens, grandes massas de material se deslocam por causa da rotação das estrelas e por diferenças de densidade e temperatura no interior delas. Levando tais movimentos em conta, eles conseguem explicar as abundâncias de lítio nelas.
Korn e sua equipe queriam saber se podiam fazer o mesmo com as estrelas mais velhas da galáxia, que se encontram na periferia dela, o chamado halo galático.
Para isso, observaram 18 estrelas do aglomerado globular NGC 6397. Enquanto muitas das estrelas do halo se distribuem uniformemente, algumas se aglomeram formando globos. A forma desses aglomerados indica que todas as suas estrelas nasceram em uma mesma época, de uma mesma nuvem.
Embora todas tenham a mesma idade, o ritmo de desenvolvimento daquelas com massa maior é mais rápido. Assim, cada estrela escolhida para o estudo representa uma fase da evolução estelar.
Eles precisaram observar cada estrela por períodos de 2 a 12 horas, em busca de diferenças entre suas composições químicas. As diferenças seriam pequenas variações na quantidade de lítio ao longo da evolução estelar, provocadas pela sua circulação e desintegração.
As quantidades encontradas de lítio e outros elementos como o ferro são explicáveis, assumindo a difusão microscópica e a circulação pouco turbulenta de material.
Além disso, Charbonne explicou que "extrapolando para trás no tempo, o conteúdo inicial de lítio do aglomerado globular e das estrelas do halo podem ser inferidas, e o valor está de acordo com as previsões da nucleossíntese do big bang."
Segundo Charbonne, com a "crise do lítio" resolvida por enquanto, o foco dos astrofísicos muda. As novas observações das estrelas do halo galático são uma oportunidade de verificar as explicações para o percentual de elementos químicos nas estrelas jovens.

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